Elogio a um vencedor

Agora que muito se tem falado da prestação do André Villas Boas (AVB), e com bons motivos, a verdade é que se há coisa a que o Porto se tem habituado é à convivência com treinadores de sucesso. Pode parecer que não, tal é o barulho da comunicação social, mas o Benfica só ganhou um(!) campeonato nos últimos 5 anos. É verdade, os restantes ficaram no Dragão, e um só treinador conquistou 3 deles: Jesualdo Ferreira.

Depois de épocas com equipas menores, Jesualdo acabou por fazer um trabalho muito interessante no Braga, sendo o verdadeiro criador do SCB que hoje conhecemos. O facto de ser um treinador que conhecia bem o campeonato Português, a somar à tendência para o drama de Co Adriaanse ditaram a rescisão com o Boavista e a entrada de Jesualdo no Porto, onde pegou no campeão nacional e o levou a mais 3 campeonatos consecutivos.

O professor foi talvez das figuras mais controversas dos últimos anos no Dragão. É um treinador campeão, tri-campeão mesmo, teve boas participações consecutivas na liga dos campeões, mas ainda assim parece não ter deixado saudades ou sequer um sentimento de gratidão para com ele.

Uns dirão que o modelo de jogo era aborrecido, outros dirão que era medroso e que poderia ter ido mais longe, mas a verdade é que não há assim tantos treinadores na história do Porto que possam apresentar um currículo tão vitorioso. O que muitos parecem querer ignorar é que durante a fase Jesualdo, o FCP perdeu capitães como Baía e Pedro Emanuel, e vendeu jogadores como Pepe, Bosingwa, Anderson, Lucho, P.Assunção, Quaresma, Lisandro ou Cissokho. Ano após ano o professor viu-se privado dos seus melhores jogadores, muitas vezes substituídos por outros claramente inferiores, e nunca se queixou. O auto-proclamado catedrático do futebol perdeu 2 jogadores e ainda hoje se queixa do que lhe calhou em sorte, Jesualdo perdeu uma equipa completa mas nunca baixou os braços, antes construindo equipa vencedora atrás de equipa vencedora.

Mais do que isso, Jesualdo foi quem liderou a equipa numa das fases mais conturbadas da história do nosso clube, sem qualquer apoio de um gabinete de comunicação digno desse nome e sem deixar que isso pudesse afectar o balneário. Uniu a equipa à sua volta, que o demonstrou mais do que uma vez, desenvolveu jogadores, ganhou troféus e foi sempre um profissional de topo.

Ele foi Tri, o Porto foi Tetra, e curiosamente, só não foi campeão num ano onde foi impedido de utilizar o seu melhor jogador, num ano onde singrou a maior onda de lesões que alguma vez havia visto no Dragão, chegando a alturas em que não havia um único extremo disponível. Olho para a equipa de hoje e vejo que é a mesma do ano passado, mas sem ossos partidos ou suspensões… Vejo os principais marcadores/assistentes: Falcão, Hulk, Varela e Ruben Micael, e reparo que destes, apenas Falcão jogou a época toda. Se pensarmos que o Fernando também falhou uma boa parte da época e jogadores como Raul Meireles, o Bruno Alves ou o Fucile estiveram fisicamente muitos pontos abaixo do que se havia visto nos anos anteriores, a pergunta que se coloca é como raio é que conseguimos ficar à frente do Sporting? O que anda esse clube a fazer?

Dito isto, não acho que Jesualdo devesse ter continuado como treinador, penso que os ciclos se esgotam e o do professor estava claramente terminado. Mas independentemente disso, o que fica é que Jesualdo realmente deu algo ao clube: liderou, ensinou e ganhou. Mas também o clube lhe deu algo, ele cresceu como treinador, aprendeu e soube ser humilde o suficiente para reconhecer e mostrar gratidão. Isso é o verdadeiro Portismo, isso é tudo aquilo que elogiamos nos nossos jogadores mais queridos, mesmo aqueles que não são fora-de-série.

Jesualdo Ferreira não atingiu o nível de monstros do passado recente como o Mourinho ou o Bobby Robson, mas durante 4 anos foi o nosso treinador, e foi com sucesso, e por tudo isso merece o nosso respeito e saudade.

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